"Ao falar você constrói mundos", alguém disse ser afirmação de Heidegger. Mas onde foram parar as palavras? "A pá lavra". Terra lavrada sem nenhuma fertilidade. Sentimento de não mundo. É estar entre, louco a frio. É estar suspenso no espaço tendo que fazer escolhas que não se dá a mínima. A questão: onde foram parar as palavras...? Se só com elas posso construir o mundo que sou é também meu destino amar e despedir-me. É o ue resta. Como sem as palavras? Como terei um pedacinho do céu? Perderam-se todas naquele último papel que foi na verdade duas mãos que se tocavam uma última vez. Ou, quem sabe, tenham apenas tirados férias. Sensibilidade? Sensibilidade em excesso? Desculpem-me por ser assim, sensível. Prometo que na próxima encarnação - se é que há uma outra possibilidade de meu acontecimento mundano - serei mais pedra do que pele. Juramentos... expiação e prêmio. É... são as palavras que visto e que me fazem construir o que sou. Então não tenho construído muita coisa? Possivelmente. Não se trata de desespero ou desamparo. Não sejamos simplistas a ponto de ver tudo através das lentes embaçadas dos lugares comuns. Faço questão de não ser este lugar comum e isso não é um peso. Estranho pensar que talvez tenham todos receio da leveza das coisas, embora digam que a buscam sempre, e por isso as recepcionam como bigornas, como montanhas, como blocos de concretos ou cofres que caem do céu e trazem em si inscritos selos das indústrias ACME. Inscrições. Atravessamentos que não ricocheteiam na pele e entram na carne. É verdade, não estamos acostumados a nos sentirmos vivos, esquecemos do que é dor, do que é perder o fôlego com palavras, com poemas, com músicas. Ah! A música! Tem sido um lugar fantástico mirabolar os dedos pelas frequências existenciais do braço de madeira que vibra e que me abraça. Nesse lugar meu coração triunfa nas arenas musicais dos sonhos e as palavras que vão para o inferno, pois eu posso viver esse indizível musicalmente. "E eu corri para o violão num lamento e a manhã nasceu azul/ Como é bom poder tocar um instrumento". Tenho pena da mortalidade da vida e ao mesmo tempo vejo uma graça imensa nisso: o que fizeste com teus sonhos? Sonhos? Que sonhos? É... culpa das palavras que migraram para algum lugar e me deixaram nesse não lugar. Pois, vão em paz sagradas palavras! Ainda tenho as notas e escalas musicais, sem falar nos modos gregos, modulações, afinações, substituições e etc. E assim eu construo meu mundo, musicalmente, muito mais colorido e movimentado, "um príncipe entre espectros". Não preciso de ti Mefisto, eu construo meu próprio céu e inferno...
Aqui estou, aqui me encontro. O que dizer sobre tal fato? Nada. Apenas sôo o vôo da Fênix em seu devir-infinito. Ora pássaro, ora cinzas...
sexta-feira, 30 de julho de 2010
terça-feira, 20 de julho de 2010
VENCEDOR - Augusto dos Anjos
Toma as espadas rútilas, guerreiro,
E à rutilância das espadas, toma
A adaga de aço, o gládio de aço, e doma
Meu coração — estranho carniceiro!
Não podes?! Chama então presto o primeiro
E o mais possante gladiador de Roma.
E qual mais pronto, e qual mais presto assoma,
Nenhum pôde domar o prisioneiro.
Meu coração triunfava nas arenas.
Veio depois um domador de hienas
E outro mais, e, por fim, veio um atleta,
Vieram todos, por fim; ao todo, uns cem...
E não pôde domá-lo enfim ninguém,
Que ninguém doma um coração de poeta!
E à rutilância das espadas, toma
A adaga de aço, o gládio de aço, e doma
Meu coração — estranho carniceiro!
Não podes?! Chama então presto o primeiro
E o mais possante gladiador de Roma.
E qual mais pronto, e qual mais presto assoma,
Nenhum pôde domar o prisioneiro.
Meu coração triunfava nas arenas.
Veio depois um domador de hienas
E outro mais, e, por fim, veio um atleta,
Vieram todos, por fim; ao todo, uns cem...
E não pôde domá-lo enfim ninguém,
Que ninguém doma um coração de poeta!
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